Entrevista
com José Régio. «O ponto G», segundo Régio!
R.B.- Meu caro José Régio, li hoje no
JN, que a sua obra poética foi considerada ultrapassada (pela temática obsoleta
à base de Deus e do diabo, do bem e do mal...) nem sequer constando
o seu nome numa antologia publicada em França em 2003. Manuel Poppe, escritor e
jornalista ilustre, insurge-se contra esse «enterramento». Quer tecer algum
comentário?
J.R.- Ainda bem que me dás a palavra,
meu caro Rouxinol. Não estou «enterrado» embora alguns o queiram fazer. A
problemátia do bem e do mal é eterna e nunca terminará. Agora com os
fundamentalismos belicistas, atingiu proporções de pandemia até. Acredito que
se queira acabar com distinções entre o bem e o mal para nivelar tudo pelo modismo
dominante. Camões, por exemplo, não acreditava nos deuses, mas, apesar de
tudo, colocou-os na sua obra como efeito decorativo e até como homenagem às
culturas grega e romana. Também quererão erradicá-lo («enterrá-lo»...) por
isso?
R.B.- Eu estou do vosso lado, também
sinto que os novos ditadores da moda literária querem espaço para si à custa
dos que não estão cá para se defenderem. A problemática do bem e do mal já vem
desde os tempos mais remotos e nunca deixará de existir. É óbvio que não se
trata de maniqueismo estulto, mas sim, a contrario, do
aprofundamento das raízes maléficas e dos alicerces das virtualidades humanas,
no sentido de melhorar estas e erradicar, na medida do possível, aquelas...
J.R.- É isso mesmo, Rouxinol. Eu sempre
fui de um agnosticismo salutar, deixando sempre uma porta aberta para a crença,
respeitando as tradições mas pondo dúvidas, desassossegado com esta
problemática que nos envolve e cujo desfecho é sempre motivo de aprofundamentos
diversos, de análises multifacetadas, estudos da mais variada índole. Mas
«sanear» escritores sempre foi típico de certo pedantismo intelectual.
Sei bem que uns foram maiores, outros menores. Uns mais profundos, outros mais
aligeirados. Uns mais cultores do estilo e da semântica, outros, mais virados
para o gongorismo de formas, para a redundância. Cada qual no seu patamar,
deverão ser respeitados. Aleixo não pode ser equiparado a Pessoa ou a Camões,
mas deve existir e ser lembrado pelo que foi, pelo que representou.
R.B. - O que acha da problemática
religiosa nos tempos actuais?
J.R._Acho muito interessante. O
papa, ao abordar o ponto G. na sua nova encíclica é digno de meditação e de
aplauso!
R.B. -É de índole sexual a tal
encíclica?!
J.R. - Não, nem de perto nem de longe!
Limita-se a abordar o problema da globalização e sua
implicação na doutrina e no nosso viver colectivo. Ele vai aprofundar uma
temática nova e de grande impacto futuro. Era bom que falasse também do ponto
G. das câmaras municipais, dos governos, esses sim, também merecem uma
análise profunda!...
R.B. - Ponto G. nas câmaras e nos
governos?! Mas quereis referir-vos a quê, concretamente?
J.R. - Eu não estou enterrado,
muito embora alguns me julguem. Eu estou atento aos excessos de generosidade
(daí «ponto G»...) de algumas câmaras, dando mordomias a torto e a direito,
facilitando reformas antecipadas aos politicamente gratos, veja-se o «caso
Dourado» na Póvoa e tantos outros por esse país fora... Depois há os excessos
com certos empreiteiros que ganham todos os concursos (limitados...) e são
prendados com «obras a mais» de tal sorte que tal generosidade é apenas um puro esbulho
do erário público. É óbvio que esses empreiteiros alvo de tanta
generosidade , depois, por gratidão, também são generosos com certos clubes,
certos partidos, certos dadores de prebendas... É o «ponto G» no seu expoente
máximo, às vezes o clímax da corrupção mais desbragada!...
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